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Conversa com meu irmão mais velho

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Mensagem por Luiz Cruz 12/10/11, 10:15 pm

Conversa com meu irmão mais velho

Agora na maturidade começo, talvez, a entender-lhe um pouco:
Você sempre gostou de estar próximo e ajudar os pobres, doentes e excluídos. É exatamente com meus pacientes mais carentes e desamparados que tenho vivido momentos de total comunhão. Eles chegam com a morte e as dores no mais fundo de seu olhar e, então, nos irmanamos na fragilidade e tragédia que nos tornam humanos. Eles são meus melhores companheiros no mistério da doença e da saúde, do viver e do morrer. Com sua simplicidade tornam-se dignos numa aceitação sem revolta do que não se pode compreender. Então só me resta ajudar com o meu melhor e pedir desculpas silenciosamente por tudo que não consegui fazer.
Ainda muito jovem virei às costas para os templos cobertos de ouro com os pobres dormindo em seus portões. Também achava estranho alguns com tanto e outros com tão pouco se todos eram apresentados como filhos de Deus.
Lembro-me, criança ainda, que você curava as pessoas e nesta hora resolvi segui-lo sendo médica. Também criança olhava cheia de medo para seu sofrimento na cruz e não conseguia entender como minhas birras infantis tinham o poder de fazer aquilo. Tive a mais absoluta certeza que tinha algo muito mal contado e nunca mais me confessei e jurei para mim mesma que mais tarde ia descobrir que história de pecado era essa.
Quando tive meus filhos mostrei a eles um bebê fofinho ao lado dos pais e cercado por animais quentinhos. Mostrei a estrela que guiava reis cheios de presentes e disse que o mundo ficou melhor porque você chegou. Mostrei suas roupas brancas e transparentes quando você, num passe de mágica, ressuscitou e garanti, muito séria, que você podia voar e que em sua casa o vovô, a vovó e o nosso gatinho iam esperar até que mais tarde pudéssemos ir até lá. Eles hoje seguem intuitivamente seus ensinamentos sem carregar nenhuma culpa por serem humanos.
Quanto ao primeiro mandamento eu sempre insisti no amar ao próximo como a mim mesma, mas, quanto a amar a Deus sobre todas as coisas, omiti esta parte e a substitui por amor a um trabalho vocacionado, por respeito, ética, caridade e compaixão. Se um dia eles sentirem este amor por um Deus que lhes traga plenitude, então que eles O adorem no altar de seus corações.
Você bateu nos fariseus no templo e como sua irmã, briguei feio quando tentaram excluir os meus pacientes pobres de um hospital sofisticado. Você gostava de estar com seus amigos, caminhando, indo a festas e casamentos, tomando vinho e confraternizando nas refeições. Qualquer semelhança com as pessoas mais alegres e descomplicadas com certeza não é coincidência.
Você disse que bem aventurados eram os humildes e puros de coração, porque deles é o reino dos céus. Convivendo com os atletas, voando, mergulhando, descendo em abismos, correndo por estradas cheias de poeira, descansando debaixo dos viadutos, viajando com corredores semi-alfabetos, enxugando o suor do rosto com a manga dos uniformes, tenho a mais absoluta certeza que a minha vida e o seu Céu com a simplicidade deles ficam muito mais divertidos.
Sei que sou uma irmã mal criada e por isso você me enviou São Charbel como tutor e, com razão, deixou que eu levasse um super tombo de bike, mas suas mãos sobre as dele protegeram minha vida e os meus olhos.
Sinto que você sempre esteve presente mesmo em minhas fases de muita revolta. Tenho certeza que você conversou comigo através de pressentimentos e intuições quando tudo era muito, muito difícil. Adoro o tutor que você me enviou. Com certeza você sabe que, apesar de todos os meus erros, sempre tentei o meu melhor. Agradeço do fundo de meu coração a oportunidade que tenho hoje de seguir os caminhos de minha alma com um olhar cada vez mais indiferente para as questões mundanas. Obrigada por nunca ter perdido o encantamento infantil pelas belezas do mundo que você criou. Confesso que você é um profundo Mistério, mas de alguma forma acho que em um milhão de gens da alma herdei uns poucos semelhantes aos seus e, apesar de precisar de ser perdoada por poucas e boas, sei que você no fundo sorri da nossa rebeldia compartilhada.
Queria lhe dizer dois últimos pedidos:
Gostaria de ser útil até a hora de morrer. Ter lucidez e inspiração suficientes para dizer uma última frase totalmente irreverente e sábia que fosse o lema de todos os meus descendentes anticonvencionais.
E, por favor, em vez de um último suspiro, que tal um último sorriso?
Até breve!
Bia

Dra. Beatriz Hollanda
(Oftalmologista e Triatleta)
(Passou esse texto para que eu pudesse avaliá-lo e responder a consideração que poderia dar ao mesmo. Infelizmente não fui rápido o suficiente, Deus tinha outro plano. Que ela esteja em paz junto ao Pai querido!)
Luiz Cruz
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